As atenções se voltam mais uma vez para a obra de Oswaldo Lamartine de Faria com esta edição do Festival Literário de Pipa, que começa hoje. É ótimo, mas é pouco. Oswaldo devia ser lido todo dia, que nem ladainha de missa.
Enquanto cascavio aqui meus alfarrábios atrás de uns textos que escrevi sobre o cabra, fiquem com o discurso que o próprio apresentou à UFRN, ao receber o título de doutor honoris causa daquela instituição. Vale lembrar que ele sequer chegou a possuir curso superior. Era um sem-diploma.
***
À UFRN, na pessoa do seu reitor Dr. Ivanildo Rêgo,
professores, funcionários e alunos.
Perdi horas de sono e de sossego tentando entender a razão
de tudo isso.
De primeiro, cuidei ter sido pelos descaminhos dos homens
neste mundo de ranger dentes, desassossegado que nem as ondas do mar. Depois,
quem sabe, o afago de vosmecês, no adeus desse meu imerecido viver. Sei lá. É
que a balança do julgamento dos amigos costuma ser manca.
E não é astúcia, pantim, nem cavilação, pois o que botei no
papel foram apenas momentos do dia-a-dia do nosso sertanejo.
Convivi com alguns deles debaixo das mesmas telhas – tenho
repetidamente confessado.
Mestre Pedro Ourives e seu filho Chico Lins – magos do
couro, zelosos e ranzinzas, da escolha do couro-verde ao derradeiro nó-cego da
costura. Ramiro e Bonato Dantas, pescadores d’água doce e memorialistas. Zé
Lourenço, tora de homem, analfabeto, cujos instrumentos de trabalho se resumiam
em um nível de pedreiro e um novelão de cordão. Pois bem, apenas com eles,
levantou 640 metros
de parede do açude Lagoa Nova sem deixar um caculo nem uma barroca – o que
deixou o engenheiro do DNOCS de queixo caído.
Olinto Ignácio, rastejador e vaqueiro maior das ribeiras de
Camaragibe. Vi, um dia, ele se acocorar na beira do caminho e ler no chão da
terra: “Passou fulano, beltrana e uma menina. É que a gente dessa terra tanto
faz eu espiar a cara cumo o rastro...” E todos já envultados com a Caetana.
Daí eu repetir: é mais deles do que meu esse título.
Mesmo assim, encabulado, areado e zonzo, tenho de confessar:
não sou soberbo nem ingrato.
Agradeço a vmc e, mais ainda, ao doutor Reitor – sertanejo
das Terras do Pôr-do-sol. Onde, naqueles ontens, os condutores das boiadas
ferravam o tronco de um pé-de-pau onde se arranchavam. Coisas de um Sertão de
Nunca-Mais. Tempos do imperador velho. Mas isso é outra conversa.
Boa noite. Façam, agora, como manda aquele menino:
Batam palmas com vontade,
Faz de conta que é turista...
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